sábado, 6 de março de 2010

Resumo para o CBHA: escritos de artista e os arquivos em transformação

Ao longo do séc. XX, muitas foram as discussões acerca da neutralidade do documento. Já em 1940, Walter Benjamin, nas suas teses Sobre o conceito da História, apontava a barbárie que envolve o processo de documentação da cultura, evidenciando assim o caráter político presente no momento de seleção, formação, conservação, interpretação e uso desses arquivos. Também Michel Foucault, em A Arqueologia do saber, revisa os conceitos de documento e de arquivo que a mutação dos paradigmas da história, quando entendida como uma discursividade em processo, tornaria possível. Nesse sentido, é a partir de 1960/70, com as revisões pós-estruturalistas da história e com a expansão das linguagens artísticas, que a relação entre obra de arte e o seu processo de documentação e de circulação – que inclui os escritos de artista – torna-se mais complexa e estreita. Os próprios documentos do e/ou sobre o processo passam a ser exibidos também como obra, num jogo ambíguo e crítico em que o artista questiona, ao mesmo tempo, os estatutos de obra e documento, circunscrevendo-os a um tempo e lugar específico. As perguntas que permeiam essas manifestações artísticas estão na própria base do conceito de arquivo. Segundo Jacques Derrida, o arquivo, em sua etimologia, remonta-nos à palavra grega arkhé, que condensaria um duplo significado: o de começo e o de comando. Afinal, não estariam os artistas, ao organizarem seus escritos em arquivos, perguntando a quem caberia o poder de custódia da memória? Ao oferecer a público os documentos do e/ou sobre o processo artístico, e não apenas a obra de arte única e acabada, vemos pois uma posição política provinda dos artistas. Abordarei algumas delas nesta proposta de comunicação, com especial enfoque no estudo de caso sobre os livros da série Documento Areal, publicação realizada desde 2001 pela Associação Cultural Arena, com sede em Porto Alegre, que, ao longo desses anos, vem estendendo a público livros organizados por artistas que tratam do processo de criação e da problemática da documentação da obra de arte. Entre as publicações, serão analisados os livros assinados pelos seguintes artistas: Karin Lambrecht, Hélio Fervenza, Maria Helena Bernardes, Elaine Tedesco. Afinal, ao documentarem suas experiências efêmeras através da escrita, estariam os artistas atuando como uma espécie de arquivista/intérprete de sua produção e aproximando crítica e criação? De que modo?

Nenhum comentário: