quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Pensamentos de Marina Abramovic



EU QUERO MENOS
"estamos tão envolvidos com consumo, uma sociedade que nos faz cada vez mais querer mais e mais, que agora eu quero menos"

SOBRE DURAÇÕES
"Se você faz uma ação de uma hora, você ainda está atuando, mas depois de seis horas, tudo desmorona, torna-se verdade essencial. E para mim, esse tipo de verdade é muito importante. Posso dar um exemplo muito simples: pegue uma porta e abra ela constantemente, sem entrar ou sair. Se você faz isso por três, cinco minutos, isso não é nada. Mas se você faz isso por três horas, essa porta não é mais uma porta, ela é um espaço, o Cosmos, se transforma em outra coisa, é transcendente. Em todas as culturas arcaicas, rituais e cerimônias eram repetidas sempre da mesma forma e existe um tipo de energia que fica alocada nessa repetição que afeta também o público. Isso só se consegue em performances de longa duração."


ARTE COMO FERRAMENTA
"Há uma ótima entrevista de André Malraux, quando ele era ministro da Cultura, na França, com Picasso, acho que nos anos 1950. Ele perguntou a Picasso porque ele tinha tantas máscaras africanas e ele respondeu que as máscaras eram muito importantes porque elas eram a chave, a ferramenta para os humanos se comunicarem com as forças divinas, com os espíritos, o desconhecido; e ele queria aprender a fazer o mesmo com suas pinturas".

Leia entrevsita na íntegra:
http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/831250-leia-a-entrevista-de-marina-abramovic-na-integra.shtml?ref=nf

MANIFESTO DE MARINA ABROMOVIC:

Manifesto sobre a vida do artista
Marina Abramovic

1 a conduta de vida do artista:
- o artista nunca deve mentir a si próprio ou aos outros
- o artista não deve roubar idéias de outros artistas
- os artistas não devem comprometer seu próprio nome ou comprometer-se com o mercado de arte
- o artista não deve matar outros seres humanos
- os artistas não devem se transformar em ídolos
- os artistas não devem se transformar em ídolos
- os artistas não devem se transformar em ídolos

2 a relação entre o artista e sua vida amorosa:
- o artista deve evitar se apaixonar por outro artista
- o artista deve evitar se apaixonar por outro artista
- o artista deve evitar se apaixonar por outro artista

3 a relação entre o artista e o erotismo:
- o artista deve ter uma visão erótica do mundo
- o artista deve ter erotismo
- o artista deve ter erotismo
- o artista deve ter erotismo

4 a relação entre o artista e o sofrimento:
- o artista deve sofrer
- o sofrimento cria as melhores obras
- o sofrimento traz transformação
- o sofrimento leva o artista a transcender seu espírito
- o sofrimento leva o artista a transcender seu espírito
- o sofrimento leva o artista a transcender seu espírito

5 a relação entre o artista e a depressão:
- o artista nunca deve estar deprimido
- a depressão é uma doença e deve ser curada
- a depressão não é produtiva para os artistas
- a depressão não é produtiva para os artistas
- a depressão não é produtiva para os artistas

6 a relação entre o artista e o suicídio:
- o suicídio é um crime contra a vida
- o artista não deve cometer suicídio
- o artista não deve cometer suicídio
- o artista não deve cometer suicídio

7 a relação entre o artista e a inspiração:
- os artistas devem procurar a inspiração no seu âmago
- Quanto mais se aprofundarem em seu âmago, mais universais serão
- o artista é um universo
- o artista é um universo
- o artista é um universo

8 a relação entre o artista e o autocontrole:
- o artista não deve ter autocontrole em sua vida
- o artista deve ter autocontrole total com relação à sua obra
- o artista não deve ter autocontrole em sua vida
- o artista deve ter autocontrole total com relação à sua obra

9 a relação entre o artista e a transparência:
- o artista deve doar e receber ao mesmo tempo
- transparência significa receptividade
- transparência significa doar
- transparência significa receber
- transparência significa receptividade
- transparência significa doar
- transparência significa receber
- transparência significa receptividade
- transparência significa doar
- transparência significa receber

10 a relação entre o artista e os símbolos:
- o artista cria seus próprios símbolos
- os símbolos são a língua do artista
- e a língua tem que ser traduzida
- Às vezes, é difícil encontrar a chave
- Às vezes, é difícil encontrar a chave
- Às vezes, é difícil encontrar a chave

11 a relação entre o artista e o silêncio:
- o artista deve compreender o silêncio
- o artista deve criar um espaço para que o silêncio adentre sua obra
- o silêncio é como uma ilha no meio de um oceano turbulento
- o silêncio é como uma ilha no meio de um oceano turbulento
- o silêncio é como uma ilha no meio de um oceano turbulento

12 a relação entre o artista e a solidão:
- o artista deve reservar para si longos períodos de solidão
- a solidão é extremamente importante
- Longe de casa
- Longe do ateliê
- Longe da família
- Longe dos amigos
- o artista deve passar longos períodos de tempo perto de cachoeiras
- o artista deve passar longos períodos de tempo perto de vulcões em erupção
- o artista deve passar longos períodos de tempo olhando as corredeiras dos rios
- o artista deve passar longos períodos de tempo contemplando a linha do horizonte onde o oceano e o céu se encontram
- o artista deve passar longos períodos de tempo admirando as estrelas
no céu da noite

13 a conduta do artista com relação ao trabalho:
- o artista deve evitar ir para seu ateliê todos os dias
- o artista não deve considerar seu horário de trabalho como o de funcionário de um banco
- o artista deve explorar a vida, e trabalhar apenas quando uma idéia se revela no sonho, ou durante o dia, como uma visão que irrompe como uma surpresa
- o artista não deve se repetir
- o artista não deve produzir em demasia
- o artista deve evitar poluir sua própria arte
- o artista deve evitar poluir sua própria arte
- o artista deve evitar poluir sua própria arte

14 as posses do artista:
- os monges budistas entendem que o ideal na vida é possuir nove objetos:
1 roupão para o verão
1 roupão para o inverno
1 par de sapatos
1 pequena tigela para pedir alimentos
1 tela de proteção contra insetos
1 livro de orações
1 guarda-chuva
1 colchonete para dormir
1 par de óculos se necessário
- o artista deve tomar sua própria decisão sobre os objetos pessoais que deve ter
- o artista deve, cada vez mais, ter menos
- o artista deve, cada vez mais, ter menos
- o artista deve, cada vez mais, ter menos

15 a lista de amigos do artista:
- o artista deve ter amigos que elevem seu estado de espírito
- o artista deve ter amigos que elevem seu estado de espírito
- o artista deve ter amigos que elevem seu estado de espírito

16 os inimigos do artista:
- os inimigos são muito importantes
- o Dalai Lama afirmou que é fácil ter compaixão pelos amigos; porém, muito mais difícil é ter compaixão pelos inimigos
- o artista deve aprender a perdoar
- o artista deve aprender a perdoar
- o artista deve aprender a perdoar

17 a morte e seus diferentes contextos:
- o artista deve ter consciência de sua mortalidade
- Para o artista, como viver é tão importante quanto como morrer
- o artista deve encontrar nos símbolos da sua obra os sinais dos diferentes contextos da morte
- o artista deve morrer conscientemente e sem medo
- o artista deve morrer conscientemente e sem medo
- o artista deve morrer conscientemente e sem medo

18 o funeral e seus diferentes contextos:
- o artista deve deixar instruções para seu próprio funeral, para que tudo seja feito segundo sua vontade
- o funeral é a última obra de arte do artista antes de sua partida
- o funeral é a última obra de arte do artista antes de sua partida
- o funeral é a última obra de arte do artista antes de sua partida

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Fotos do processo de montagem atualizadas no Flickr


Pessoal,
pra quem tiver curiosidade, aí vai o link com fotos da montagem (by Gerson Derivi Marques) da minha exposição no Museu do Trabalho, que fica em cartaz até 17 de outubro:

www.flickr.com/lilianmaus

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Trecho de Goethe - sobre o prazer do olhar

Felizes, vós olhos
Que tudo o que vistes,
Não importa o quê,
Foi um prazer ver

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Exposição Tramas Diárias - Museu do Trabalho


Imagens de divulgação da exposição Tramas Diárias (foto postada acima clicada por Túlio Pinto) - individual Lilian Maus / Museu do Trabalho - Porto Alegre dia

ABERTURA: 25 de agosto de 2010.


Por aqui, sigo trabalhando muuuuuuuuuito!!!

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Fragmento precioso de Octavio Paz

“Allá, donde terminan las fronteras, los caminos se borran. Donde empieza el silencio. Avanzo lentamente y pueblo la noche de estrellas, de palabras, de la respiración de un agua remota que me espera donde comienza el alba.”

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Mergulhos interiores

Às vezes, ela se sentia sugada pelo olhar dele. Um homem de pupilas dilatadas que a inquietava. Não eram apenas seus olhos trêmulos, ele lançava ruídos no ar. Seu cheiro e sua voz tomavam conta de um ambiente inteiro, trazendo-lhe inúmeras lembranças que não passavam pela mente, mas, através de todos os seus orifícios, a penetravam. Tudo a fazia convergir em torno daquele olhar de neblina. Bastavam alguns segundos para os orifícios negros daquele homem se tornarem poços profundos e simétricos, que a convergiam ambos para um único lugar: um túnel negro e úmido, em que, entre atração e repulsa, ela se deixava sugar.


Ao mergulhar nele, deparava-se com alguns pontos luminosos pulsantes, que lhe apontavam limites ou, quem sabe, saídas. Pontos claros que, feito estrelas, iluminavam a noite, revelando um brilho intenso que rasgava a superfície de olhos lacrimejantes. Ela,então, encontrava sua própria imagem refletida. Ver-se ali a reconfortava.

Nesses dias de mergulho, costumava também sonhar com uma noite clara,em que ela não teria mais medo do escuro, nem do silêncio. Nessa noite, os seus suspiros áridos cessariam e ela experimentaria a vida menos grave, apenas submergindo. Um mergulho sem volta, que transformaria todo o oco de seu umbigo em um grande orifício de
baleia. Pouco a pouco, seu corpo se moldaria à correnteza, ausentando-se de todo peso. E ela permaneceria sonhando com o dia em que serviria de isca aos olhos da criança pega de surpresa, ao brincar com o caniço na beira do rio que a transformara.


Nesse dia, como um raio de luz na tempestade, ela seria o motivo de todo espanto, o próprio desconhecido. Ao despertar do sono provocado pelas sombras daquele homem misterioso, ela sentiu saudades de certos fluidos, de tantas neblinas que um dia romperam, agudamente, a divisão entre luz e penumbra, entre homem e mulher.

Take Away Show #106 _ PABLO MALAURIE (part 1) from vincent moon / temporary areas on Vimeo.



Take Away Show #106 _ PABLO MALAURIE (part 2) from vincent moon / temporary areas on Vimeo.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Fotos da abertura da exposição Móbiles - Nelson de Magalhães (org. Lilian Maus)

Pessoal,

abaixo posto imagens enviadas por Mário Fontanive, tiradas do seu cel durante a abertura da exposição Móbiles, que está imperdível.

Vejam aí:

MAIS IMAGENS EM: http://www.espmfoto.com.br/site_antigo/public_html/eventos/



sexta-feira, 4 de junho de 2010

Exposição Móbiles, de Nelson de Magalhães (Org. Lilian Maus)




Imagem dos escritos e esboços para os móbiles, de Nelson de Magalhães (foto de Dedé Ribeiro)

Convido a todos para a exposição "Móbiles", de Nelson de Magalhães (Organização: Lilian Maus)
Abertura: sábado, 5 de junho, às 11h (entrada franca)
Local: Espaço Cultural da ESPM/RS (R. Guilherme Schell, 268 – Porto Alegre)
Visitação: de segunda a sexta, das 8h às 22h, e aos sábados, das 9h às15h
Encerramento: 22 de julho de 2010
Conversa com artista: 22 de junho, terça-feira, às 11h20min (entrada franca)
Informações e agendamento de visitas: espacocultural-rs@espm.br ou tel. 3218.1300

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Ebooks apontados por Café Filosófico

Vale a pena dar uma olhada nos links apontados pelo Café Filosófico.
Várias referências pra download.

http://cafesfilosoficos.wordpress.com/about/e-books/

segunda-feira, 29 de março de 2010

Nelson Goodman e o "quando é arte?"

Artigo esclarecedor sobre Nelson Goodman.
por Isabel Rosete, 2007


Alguns Dilemas da Estética Contemporânea: Arte e Simbolização

http://isabelrosere.multiply.com/journal/item/9/9

Paralelos entre a arte e o sorriso

Lendo uma entrevista de Waltércio Caldas a Felipe Scovino no livro lançado recentemente "Arquivos Contemporâneos", retirei uma pérola poética da fala de Waltércio. A referência dele foi "O nascimento da arte", de George Bataille. Estou louca pra ler. Aí vai aproximadamente o dito:

A arte e o sorriso nasceram na mesma época e pelo mesmo motivo: no espanto do homem a perceber-se mortal.

terça-feira, 23 de março de 2010

O grande mistério da vida - André Malraux

"O grande mistério não é termos sido lançados aqui ao acaso, entre a profusão da matéria e das estrelas: é que, da nossa própria prisão, de dentro de nós mesmos, conseguimos extrair imagens suficientemente poderosas para negar a nossa insignificância."

André Malraux in A Condição Humana, 1933.

domingo, 21 de março de 2010

Vídeo sobre Rauschenberg e sua obra Erased De Kooning

Vale a pena assistir o vídeo!

http://mais.uol.com.br/view/9c508uckp29e/robert-rauschenberg-fala-sobre-a-obra-erased-de-kooning-040268D09933E6?types=A&

Algumas curiosidades de René Magritte

Encontrei este texto com alguns dados biográficos de René Magritte:


"Magritte os odiava [dados biográficos], e irritar um artista já falecido é uma atitude que ele certamente aprovaria do alto de seu pedestal surrealista. "Detesto meu passado, assim como o de qualquer pessoa. Detesto a resignação, a paciência, o heroísmo profissional e os belos sentimentos obrigatórios. Também detesto as artes decorativas, o folclore, a publicidade, vozes anunciando algo, a aerodinâmica, os escoteiros, o cheiro de naftalina, fatos do dia, e gente bêbada." Tomemos, pois, mais um gole de uísque e continuemos com os dados biográficos."

"Magritte pouco se lembrava da própria infância, e suas memórias ficariam melhor num de seus quadros que numa autobiografia, já que se referem a fantasias de padre, a misteriosos baús e a eventos estranhos como um par de balonistas com roupas de couro que ficaram presos ao teto de sua casa, com o respectivo balão murcho e inútil. Junto a este enevoado de lembranças, aparece a morte da mãe de Magritte, afogada em 1912. O pai mudou-se então, com René e seus dois irmãos, para Charleroi, onde o artista conheceria sua futura esposa e modelo de muitas telas, Georgette Berger."

Fonte: http://www.burburinho.com/20030427.html


Deu-me uma vontade enorme de pesquisar mais a fundo esta história.

Sobre a imagem acima, uma fotografia da obra "A Tempestade", de Magritte, pergunto:

Seria um presságio da tempestade ou talvez a metáfora de dois amantes?
Seria uma junção de fragmentos ou uma denúncia da separação originária?
Ou seria antes uma décollage conceitual, em que esses fragmentos de imagens aludem a diferentes tempos (a imobilidade dos cubos, a tensão das nuvens a prometer movimento, o céu num límpido gradiente de azuis)?

O que me parece mais intrigante nesta imagem talvez nunca me ocorresse se estivéssemos frente a frente: a interferência sutil do aparato fotográfico que a captou. Olhando com cuidado, é possível perceber uma janela ao fundo, uma espécie de reflexo sutil do provável vidro que protege a obra. Pouco a pouco, esses resíduos impregnados na transparente (será?) superfície do vidro revelam todo um mise-en-scène, rico em silhuetas, janelas, paredes, outras pinturas. Um outro mundo cabe na tela, fazendo da imagem uma janela/espelho, inviolável enquanto projeção refletida, mas também permeável aos mergulhos que nos levam para dentro de nós mesmos.

sexta-feira, 19 de março de 2010

quinta-feira, 18 de março de 2010

Achados de Joan Brossa: o museu portátil

Joan Brossa, artista catalão nascido em 1919, possui uma obra vigorosa e intrigante. Teve passagem pelo Brasil e manteve trocas com alguns poetas concretos brasileiros.

Segundo Marcelo Terça-Nada:

"Toda sua vida pode ser vista como um processo de experimentação constante que resultou numa impressionante obra plástica e poética: numerosos trabalhos de poesia em verso, poesia visual, poesia objeto, instalações, poemas transitáveis (esculturas-poema em locais públicos), poemas cênicos (textos para teatro) e roteiros cinematográficos." (http://marcelonada.redezero.org/artigos/joan-brossa.html)

Achei essa fotografia fantástica, obra titulada Museu (1996), queria eu tê-la feito!
Muita confluência com o que venho pensando... uma lição e tanto!


quarta-feira, 10 de março de 2010

Rimbaud - "Porque Eu é um outro"

"Porque Eu é um outro. Se o cobre se descobre clarim, não há aí nada de culpa sua. Isso é evidente para mim: assisto à eclosão do meu pensamento: vejo-a, escuto-a: lanço um movimento com o arco: a sinfonia vai abalando as profundezas, ou salta de repente para o palco."

Fragmento de CARTAS DO VISIONÁRIO, de Arthur Rimbaud para GEORGES IZAMBARD
Charleville, [13] de Maio de 1871

Maurice Nadeau, no livro "A História do Surrealismo" aponta a importância de Rimbaud para o Surrealismo, resgatando uma frase de André Breton escrita originalmente em "Caractères de l'evolution moderne", Les Pas Perdus: "Se aquilo que ele traz de 'baixo' tem forma, ele dá forma; se é informe, ele dá o informe." (Breton citado por Nadeau, p.41)

E Nadeau continua: "O importante é não romper a corrente, manter esta atividade fora das preocupações da arte e da beleza. O risco vale a pena: trata-se nada mais nada menos de chegar ao desconhecido. Neste contexto, o poeta se faz 'vidente', 'ladrão de fogo', 'multuplicador de progresso', à custa de 'horrível trabalho'." (p.41)

segunda-feira, 8 de março de 2010

sábado, 6 de março de 2010

Resumo para o CBHA: escritos de artista e os arquivos em transformação

Ao longo do séc. XX, muitas foram as discussões acerca da neutralidade do documento. Já em 1940, Walter Benjamin, nas suas teses Sobre o conceito da História, apontava a barbárie que envolve o processo de documentação da cultura, evidenciando assim o caráter político presente no momento de seleção, formação, conservação, interpretação e uso desses arquivos. Também Michel Foucault, em A Arqueologia do saber, revisa os conceitos de documento e de arquivo que a mutação dos paradigmas da história, quando entendida como uma discursividade em processo, tornaria possível. Nesse sentido, é a partir de 1960/70, com as revisões pós-estruturalistas da história e com a expansão das linguagens artísticas, que a relação entre obra de arte e o seu processo de documentação e de circulação – que inclui os escritos de artista – torna-se mais complexa e estreita. Os próprios documentos do e/ou sobre o processo passam a ser exibidos também como obra, num jogo ambíguo e crítico em que o artista questiona, ao mesmo tempo, os estatutos de obra e documento, circunscrevendo-os a um tempo e lugar específico. As perguntas que permeiam essas manifestações artísticas estão na própria base do conceito de arquivo. Segundo Jacques Derrida, o arquivo, em sua etimologia, remonta-nos à palavra grega arkhé, que condensaria um duplo significado: o de começo e o de comando. Afinal, não estariam os artistas, ao organizarem seus escritos em arquivos, perguntando a quem caberia o poder de custódia da memória? Ao oferecer a público os documentos do e/ou sobre o processo artístico, e não apenas a obra de arte única e acabada, vemos pois uma posição política provinda dos artistas. Abordarei algumas delas nesta proposta de comunicação, com especial enfoque no estudo de caso sobre os livros da série Documento Areal, publicação realizada desde 2001 pela Associação Cultural Arena, com sede em Porto Alegre, que, ao longo desses anos, vem estendendo a público livros organizados por artistas que tratam do processo de criação e da problemática da documentação da obra de arte. Entre as publicações, serão analisados os livros assinados pelos seguintes artistas: Karin Lambrecht, Hélio Fervenza, Maria Helena Bernardes, Elaine Tedesco. Afinal, ao documentarem suas experiências efêmeras através da escrita, estariam os artistas atuando como uma espécie de arquivista/intérprete de sua produção e aproximando crítica e criação? De que modo?

segunda-feira, 1 de março de 2010

Parte I: O menino sem rosto


Com a luz refletida no rosto, ela sentia a pele esbranquiçar sob efeito do sol nascente. Era hora de se levantar.
Tão logo pulou da cama descalça, ela se dirigiu ao banheiro. Após lavar o rosto com água bem fria e suspirar, soprou, com toda força que tinha, o ar para fora de si naquela hora da manhã. Enquanto isso, observava aliviada as gotículas de água escorrerem pelo rosto. Preferiu não secá-lo na toalha. As bochechas molhadas e enrubrecidas faziam assim uma engraçada combinação com a sua camisola vermelha de cetim.
O dia estava iluminado e, diante daqueles interiores do apartamento, ela não necessitava mais de seu passeio diário. Decidiu assim ficar em casa, na companhia do sol. Mas o dia estava virando.
Ao olhar para as paredes, fixando-se na bela textura luminosa que projetava-se sobre a tinta escura, avistou a silhueta negra de um menino sem rosto, como se os fantasmas de sua casa de infância estivessem voltando.
No entanto, sem ver seu rosto, ela não podia dizer que já o conhecia. Naquele instante, sentia-se diante de um estranho. Mas o menino falava com ela, dizia-lhe algo incompreensível. O tom era seco. Ele não sorria. Ela pediu-lhe várias vezes que repetisse, pois era difícil diferenciar suas sílabas. Estaria o menino bravo? Ou ele queria apenas assombrar-lhe? Onde estaria o seu rosto?
"Aproxime-se", disse ela.
Mas o menino relutou dizendo:
"É melhor mantermos a distância".
Foi a primeira frase que ela pôde compreender. Em seguida ela perguntou-lhe:
"Mas por que mantermos distância? Não entendo o que dizes".
Silêncio. O menino disse mais duas ou três frases incompreensíveis, embora o tom fosse reconhecidamente seco. Foi quando ela perguntou a ele:
"Por que tanta secura?"
E o menino retrucou com facilidade:
"Essa secura aprendi aqui".
Ela compreendeu o som das palavras, mas não captava o sentido. Colocou a mão no rosto e ainda podia senti-lo molhado da água fria da torneira. Avistava suas próprias palavras contra o sol e elas pareciam respingar um vapor úmido, junto com a poeira revelada pelo feixe de luz. Ela perguntava-se, em silêncio, desde quando o menino sem rosto a conhecia, o que ela fizera para parecer-lhe tão seca?
"Eu? Seca?", ela perguntou àquele rosto vago.
E ele respondeu:
"És pura instabiliade, um dia estás seca e no outro, acordas molhada."
E assim o menino desapareceu na penumbra. Não havia mais sombra projetada, nem era mais possível regar a conversa. A luz tornava-se difusa, pois o dia estava nublando.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Ensaios - texto ligeiramente alterado desde a primeira versão de 2005.


De certo, naqueles dias nublados, tudo parecia um palco. O público inerte nem percebia quando a atmosfera era tomada por ares irreais, suas preocupações eram de outra ordem. Eles olhavam muito para o relógio e não percebiam que naquele sorriso desenfreado da atriz principal escondiam-se,além de angústias internas, alguns mistérios. Dia após dia, a peça não mudava, embora o riso da protagonista, ao longo do tempo, tivesse se tornado mais seco. Era surpreendente como, depois de anos, as cenas de riso ainda a levavam rumo ao gozo pleno. Ali ela não atuava, apenas flutuava dizendo a si mesma: “Que plenitude!”. Mas, no intervalo da peça, acabava percebendo o palco e, com as pernas pesadas e atadas, avistava o público. Lançando então um olhar distante cuja habilidade era transformar toda matéria em névoa, ela brincava de transfigurar os rostos em borrões, deixando a luz escapar-lhe por inteiro e preenchendo o espaço com cores mais vivas ou mais mortas, dependendo de seu estado de espírito. A brincadeira continuava até que se sentisse totalmente perdida. Às vezes, por medo, o jogo acabava rápido.

A peça, no entanto, seguia sem novidades. Tudo continuava meticulosamente igual desde o ponto em que ela a havia retomado. Cena após cena, a atriz fixava-se na imobilidade das coisas: às vezes eram as pequenas frestas entre as tábuas do palco, outras vezes, a poltrona vazia, o padrão da textura no tecido da cortina, ou então, os gestos repetitivos das mãos de um colega. Enquanto a cena seguia, entre um verso e outro, ela costumava perceber certos vãos no tempo. Mas como era possível viver em tal descompasso? Por vezes ela pensava: “Vou arrancar de vez esta máscara e saltar nas lacunas deste palco insano. Afinal, o que eu teria a perder?”.

E um dia a atriz de fato tentou. Ela chegou à beira do abismo para saltar e, ao olhar para trás com um canto de olho desconfiado, acenou em despedida para os colegas de palco. Em seguida, respirou fundo, ergueu os braços bem altos e, com o peito estufado de ar, sentiu o vestido apertar e enrijecer o corpo todo, tal como uma armadura. Ela estava no limite. Esperou mais cinco segundos e desistiu. Atribuiu a desistência ao chamado de um colega de palco, que, com sua voz magnética, exigia-lhe uma resposta. Ainda que estivesse sendo sugada para um diálogo previsível, ela insistia em alimentar a esperança de que as vibrações do som lhe revelassem algo novo. As surpresas não vieram. No entanto, ao girar o corpo dando as costas ao abismo, sentiu a meia-calça apertada descer perna abaixo. Num único contra-golpe ela puxou a meia de volta, ainda que não pudesse evitar que ela se rompesse.

A verdade é que ela quase escapara dali, daquele lugar que ela odiava e, ao mesmo tempo, amava, um lugar deserto que a dominava, fazendo-a caminhar rumo ao sem fim enquanto ela sonhava manipular a si mesma como títere num outro deserto em miniatura.


Um dia, enquanto ela atuava, o palco ruiu.

Envolta pelo eco de uma gargalhada triunfante, ela sentia o alívio trazido pelo cheiro úmido da chuva. Quanto tempo se passara? Ela estava em sua casa agora, no banheiro, a ouvir o som trazido pela ducha e a limpar repetidamente o espelho recoberto de um vapor úmido que engolia a sua silhueta aos poucos. Ela apenas brincava, desejando inverter as regras de seu antigo jogo, a transformar a névoa em matéria, num esconde-esconde com a própria imagem no espelho. E assim deliciava-se ao tocar, com a ponta dos dedos, aquele rosto morno e aparentemente fugaz, a sentir a vida breve em suas mãos.

Sobre Onetti e o poder da fantasia

"Para mim, os fatos nus e crus não significam nada. O que importa é o que contêm ou o que acarretam; e depois verificar o que há por trás disso e por trás disso de novo até o fundo definitivo que nunca poderemos tocar", diz o narrador do conto Matías, o Telegrafista.

Hoje fui presenteada com o conto "Um sonho realizado", do escritor uruguaio Juan Carlos Onetti (1909-1994). Em uma atmosfera onírica, o desafio de representar um sonho banal de uma estranha mulher é vivido por dois amigos que se vêem herdeiros da síntese de uma vida. E este último ritual, em um leito de morte disfarçado de arena, romperá as barreiras entre viver e narrar.

domingo, 31 de janeiro de 2010

Fragmento das teses de Benjamin Sobre o Conceito de História

2ª tese:

"O passado traz consigo um índice misterioso, que o impele à redenção. Pois não somos tocados por um sopro do ar que foi respirado antes? Não existem, nas vozes que escutamos, ecos de vozes que emudeceram? Não têm as mulheres que cortejamos irmãs que elas não chegaram a conhecer? Se assim é, existe um encontro secreto, marcado entre gerações precedentes e a nossa. Alguém na terra está à nossa espera."

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Pequenos gestos resistentes

Pina Bausch depois de uma aula sobre "Diário de um ano ruim", de Coetzee, produz um efeito estético incrível.

sábado, 9 de janeiro de 2010

Nota sobre caligrafia - artigo de Umberto Eco na Revista da Cultura (ed. 28/nov 09)


A arte perdida da caligrafia - Umberto Eco

"A arte da caligrafia nos ensina a controlar nossas mãos e encoraja a coordenação mão-olho.
O artigo de três páginas apontava que a escrita a mão nos obriga a compor a frase mentalmente antes de escrevê-la. Graças à resistência da caneta e do papel, somos forçados a parar para pensar. Muitos escritores, embora acostumados a escrever no computador, algumas vezes até preferem imprimir letras em uma placa de argila, porque assim podem pensar com mais calma." (p.29)